“Talvez essa parede que obstrua sua visão
seja a única
coisa que lhe impede de cair no abismo...”
Nos arredores de uma grande e cinza
metrópole, havia um penhasco, tão profundo e escuro que nem mesmo o mais forte
raio de sol era capaz de transpor a sua eterna escuridão. No entanto, do outro
lado desse abismo havia uma floresta inexplorada e um vasto e colorido
horizonte, cujo maior destaque era uma árvore de titânicas proporções e
exuberante beleza.
Alguns habitantes batizaram-no de Vale da
Sabedoria, pois os poucos que lá colocaram seus pés denunciaram segredos
cósmicos que estavam muito além do limite humano.
Mas certo dia, não se sabe exatamente
como, a ponte que ligava esses dois mundos se rompera, e havia quem acreditasse
que fora uma ação criminosa, outros, um acidente, mas, a verdade de fato nunca
se revelara.
Desolados, alguns habitantes curiosos
ainda buscavam o vale, e sentavam na beira do abismo, e faziam questionamentos
sobre o habitava o outro lado. Mas, mesmo enxergando esse mundo apenas de
longe, suas mentes cada vez mais se abriam, e a maioria, extasiados pelas
visões, ou inconformados pela sua incapacidade de alcançar o outro lado,
acabavam por se lançar no abismo.
Essa cena insana se repetiu por várias
vezes, até que, visando o fim dessas tragédias, as autoridades locais decidiram
levantar uma imensa parede de alvenaria nos limites da cidade, que cercava todo
o perímetro do abismo.
Os anos se passaram, e a parede continuava
ali, gerando dúvidas nas gerações mais novas, que questionavam o porquê da
existência daquele imenso muro, e o que ele mantinha oculto do outro lado.
Devido ao grande crescimento populacional
que a cidade alcançara, os habitantes começaram a construir suas moradias em
volta do muro. Alguns mais espertos aproveitavam a muralha como uma das paredes
de sua casa, economizando assim, tempo e material. Logo, a ideia se espalhou, e
os outros vizinhos aderiram ao mesmo recurso.
Assim que as construções ficavam prontas,
e a parede começou a atiçar a curiosidade de três vizinhos, que passaram a
questionar a mesma, e começaram a quebrar para saciar a vontade de descobrir
tudo que havia de oculto.
O primeiro destruiu seu lado da Parede em
um ritmo incontrolável, e, em apenas um dia, havia concluído a sua tarefa.
Ficou maravilhado com a visão do Vale da Sabedoria, e passava várias tardes,
olhando para esse horizonte, buscando maneiras de alcançar o outro lado. Mas
por alguma razão não conseguia pensar em nada, e ao olhar mais uma vez para
aquele gigantesco vale que estava fora de seu alcance, sua frustração o
consumiu, e este marchou rumo ao abismo, afundando em sua própria tristeza.
O segundo, ao assistir todo o fracasso do
primeiro explorador, hesitou em quebrar o seu lado, por temer o mesmo destino,
pintou na Parede uma bela paisagem, semelhante à do Vale, porém com alterações,
e apenas essa pintura foi o bastante para curar sua tristeza por não poder
alcançar o outro lado.
Um terceiro, que morava distante dos dois
primeiros também passou a quebrar o seu lado da Parede, mas com cautela, e
fazia pequenos buracos, de onde era possível avistar o Vale. A cada singela
olhada, ele via algo novo, e cada vez mais conseguia imaginar meios seguros de
alcançar o outro lado.
Após muito tempo coletando material e
fazendo cálculos, o terceiro vizinho construiu uma ponte, e finalmente pode
destruir por completo o seu lado da parede, e assim conseguia livremente ir
voltar do Vale.
Agora simplesmente cabia aos outros
vizinhos repetir o seu ato.
FIM